segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

*SIMPLESMENTE SE A GENTE PERMITISSE


-Se a gente permitisse,

a partir desse instante,

que minha mão e a sua

se apertassem fraternalmente,

nossos corações distantes,

teriam a necessária chance

de se conhecerem melhor.


-Aí, quem sabe,

entre mim e você

tudo mudaria

e, ainda em tempo,

a gente se descobriria.


-E pelo mundo afora

um frente ao outro

a gente se deixaria estar,

fosse num banco de jardim,

num leito de motel,

na mesa de um bar...


-É provável que aí,

nossas cabeças curtidas

em nós descobrissem

aquelas bocas perdidas

por onde um dia falamos,

todas as linguagens esquecidas.


-E a gente, então, alegre passaria,

A falar, ouvir, agir e entender

da perspectiva de uma outra dimensão,

desprezando o postiço discurso

de nossas cabeças civilizadas.


-Maravilhas dessa natureza

Estariam a nos acontecer

se a gente, simplesmente, permitisse

que, a partir desse instante,

Minha mão e a sua,

se apertassem fraternalmente.


-Simplesmente se a gente permitisse.


  • N.A. Poema originalmente publicado no livro
  • “Estágios de Crescimento” / Celso Lima Velame ,Editora Contrmp - 1985

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

PERSEVERÂNÇA


Eu não desisto de mim

nem de ti abro mão.

Reflito, me debato,

me conflito contigo...

eu não me abato.

A experiência nos diz

que enxergamos o exterior

quando luzes lançamos

ao universo interior.

Inspirado neste princípio,

perseverante prossigo

instalando pontos de luz

por toda a extensão de mim.

Enquanto isto,

assisto aqui fora,

uma tímida e turva aurora,

veloz assumindo a forma

de um belo dia de sol.

As coisas que me cercam

começam modestas

a exibir brilho próprio.

Logo tudo será luz.

Os brilhantes da vida

reluzirão imponentes

até mesmo nos pântanos.

E eu poderei conhecer

e até ajudar-te a ver

o melhor dos nossos corações.

Eu não desisto de mim

nem de ti abro mão.

Logo tudo será luz

e um do outro

não mais nos perderemos

nos labirintos sombrios

de nossas vidas confusas.

CONTRASTES


Que diferença !

Acordo hoje em minha terra

e, sem receios,

das mamas da vaca,

extraio o farto, puro e nutritivo leite.

Que diferença !

ontem, na Metrópole,

apenas, para despoluir-me

mamava, em seios de plástico,

a inconsistente e escassa

seiva fabricada.

Piso, agora,

nos caminhos de roça

e sinto a areia

acariciar meus pés,

despertando, em meu ser,

a poesia adormecida !

Que diferença !

Há pouco, na cidade grande,

escondidos em sapatos,

meus pés flutuavam

sobre um chão maquiado,

enquanto que meu ser, a cada passo,

se embotava de materialismo.

Que diferença !

Com os olhos deslumbrados,

olho, nos olhos do meu bem,

e neles vejo refletidas

as flores do campo.

Que diferença !

Outrora, nos olhos dela,

telas lacrimejantes,

triste, via o horrorizante

desespero do mundo.

Que diferença !

Abraço, hoje, a minha gente,

aspiro a vida e expiro amor.

E, ontem, na Metrópole...

deixa pra lá.

É PRECISO


Sim, é preciso

encarar o oposto do sonho,

a vida realidade,

a vida desacreditada,

a vida não vivida;

ouvir o passarinho

que ainda vive

em nossos corações.

É preciso sim,

abrir o robô,

soltar o homem,

fazê-lo participar;

buscar no espesso artificial,

o momento puro da vida;

dizer da verdade jamais dita

sobre o amor tão renegado.

É preciso, sim,

andar descontraído pelas ruas,

desarmar o espírito e o corpo;

afinal, tantas... tantas vezes,

o inimigo nem sequer existe!..

Sim, é preciso

abrir janelas

nos olhos mecânicos

e enxergar a alma do mundo,

descobrir este mundo oculto,

este mundo gente,

onde, ao longo de calmas avenidas,

com aceitação,

mãos estranhas se apertam

numa muda comunhão de idéias.

É preciso sim,

Temperar com o amor acústico,

as relações distantes, impessoais,

desses tempos cibernéticos, virtuais,

Sim, é preciso,

deixar que o sol contido

ilumine o horizonte escuro.

É preciso, sim,

ver, como eu vi,

tudo aquilo que eu não via.

PEDIDO DESESPERADO


Molhe o pincel, criança,

idealize um quadro !

Rompa o silêncio,

improvise um poema !

Alguma coisa nos diga,

motive o nosso falido viver !

Necessitamos e muito de ouvir

os seus conceitos de vida,

ver a vida à sua maneira.

Estamos cansados e perdidos

levando o mundo ao caos.

Impeça o grande desastre ! ! !

Revelados pelo poder,

invalidamos o meio ambiente,

receitamos discórdias fatais

e matamos, covardes, em nós,

suas doces amiguinhas...

Deveríamos estar loucos; eu bem o sei.

Agora, sem crédito, pedimos-lhe:

levante ao alto uma proposta,

una as criaturas que dividimos,

zombe de toda a nossa “sabedoria”.

Pinte e erga bem alto

a face desse nosso mundo:

precisamos vê-la como você a vê,

sem distorções, sem interesses.

Por favor, meu amor !..

os meios estão ao seu alcance.

Improvise ligeiro um quadro

e traga de volta aos nossos olhos

as lágrimas de que tanto precisamos.

O SALVADOR QUE TANTO ESPERAM VOLTAR

Tenho da tua campanha

as melhores notícias.

Do relacionamento humano,

satisfatórias referências.

Parecíamos bem melhores

à tua orientação produtiva.

Éramos mais espontâneos

e não existia tanto ódio.

Até hoje não sei ao certo

o que levou nosso Pai

a permitir que te afastassem daqui,

quando éramos tão crianças ainda,

quando tanto tínhamos a aprender !

De Ti e do Velho

todos muito falam.

Muitas histórias,

muitos livros existem.

Sois hoje

mil religiões, mil verdades...

Todavia, de próprio punho,

nada de vós tenho

para minha certeza.

O mesmo problema irresoluto

existe em relação a Sócrates

e outros grandes vultos do passado,

decisivamente influentes no presente.

Inúmeras vezes me pergunto

enquanto leio:

até que ponto estarão vós

no pensamento que, a vós,

dizem os profetas pertencer ?

Sabendo-se que, nas relações humanas,

é, o subjetivismo, fator preponderante

como determinar nesses escritos

admirador e Admirado

Se, por parte Deste,

não se conta com o material da comparação ?

Sem as resposta,

sugiro a mim

procurar do Pai a ideologia

na maravilhosa harmonia

das coisas da natureza.

Quanto a Ti, mano,

vou decifrando

à medida em que me decifro,

entendendo que,

quanto mais próximo estiver

do homem bom que há em mim,

mais próximo estarei do dia

em que todos os humanos

reconhecerão em si mesmos

o Salvador que tanto esperam voltar.

CONFISSÃO A SANGUE QUENTE

Eu olho nos seus cabelos,

pesquiso os seus olhos,

minucioso, estudo seus lábios...

Pelo seu tronco resvalo,

contemplando embevecido,

fotografando pro sempre,

os seus seios, seus quadris,

seu ventre, suas pernas...

Confirmando que tudo em você

é mesmo símbolo do belo.

E aqui começo a questionar

se poderia mesmo o acaso,

através de um fenômeno químico

tê-la construído, assim,

tão incrivelmente perfeita !...

Avançado neste deleite visual,

embriagado de tanta beleza,

sobre você me inclino eletrizado,

cedendo aos intensos impulsos

de nosso inflamado desejo comum.

Ó deusa de todos os meus dias...

que delícia vivê-la concreta,

no calor deste trato carnal!

Antes que este instante se vá

digo-lhe, assim, já agonizante,

que você é o inexplicável

me fazendo apelar para o misticismo.

Que você é minha crença nascente

na existência de uma força suprema,

criadora e maestro regente

de todo o imenso universo

e dessa vida contagiante

que, generosa, pulsa na gente.

FAZENDO JUSTIÇA (Canção do Exílio)

Eu que sempre me julguei

homem com a vida associado,

boquiaberto, agora, me descubro,

homem ao seu berço atado.

reagindo, hoje, pedirei,

na figura do terno sabiá

que em mim por inteiro se cale

este mudo eu me quer sufocar.

Possuído, então pelo silêncio,

deixarei penetrar-me o interior,

a alma acolhedora desta terra

para senti-la em seu todo esplendor.

Meu coração, assim, liberto,

muito surpreso e presto,

também amores e primores

por aqui achará decerto,

escapando, ileso, ao nocivo incesto.

Enquanto eu, ainda em vida,

conhecido de fato terei

dos mundos e seres a nata,

lhes fazendo a justiça que neguei.

E, apossado de minha real identidade,

moderado no ofuscante narcisismo,

conviverei com todos os povos,

em grau de permanente igualdade,

sem preconceitos, dependências ou egoísmo.

DO QUE EU TENHO PARA LHE DIZER, MULHER

Meu modo de lidar com você, reconheço,

ainda é insatisfatório, comprometido.

Resquícios de condicionamentos, talvez repressões,

induzem, sorrateiramente, este controvertido homem,

a comportar-se de acordo com certos padrões.

Careço, de algum tempo, por ilustração,

remeter aos seus ouvidos reais,

inconfessadas impressões minhas a seu respeito.

Simples coisas tal como dizer:

tenho pelo que agora intuo em você

incondicional admiração e proclamo:

nenhum dos inúmeros papéis que lhe destinam

alcança suplantar a sua ocultada natureza.

Confunde-me, porém, no expressar e viver estas convicções,

a múltipla experiência que provei com você:

mãe, babá, irmã, professora, namorada, modelo, política...Enfim,

passeiam por mim tantas e tão diferentes você...

O meu senso crítico, perante tal volume de informações

se desorienta, é claro, e paralisado se omite,

deixando-me a contatar planos e caricaturas suas

em lugar de abordá-la objetiva, inteira, essencial.

Olhá-la sem mistérios, sem legendas, sem obrigações...

leva o tempo de eu temer não chegar a vê-la assim.

Iconoclasta acuado por este desafiador impasse,

vejo no autoconhecimento a senda mais breve para você.

E, nesse sentido, confio na sua aptidão no entender os humanos.

Indenizá-la por sua solidão eu prometo na minha chegada.

Reencontrá-la ligeiro, portanto, ao reencontrar-me, saiba,

alguma coisa é que almejo e em que me empenho no presente.

MONÓLOGO

Mergulharei ainda mais fundo, acreditem !

As profundezas não me causarão pânico.

Romperei lajes de culturas submersas,

investigarei minuciosamente minhas imagens antepassadas,

as suas fontes geradoras, o meu sentido nesses momentos históricos.

Dentro de pouco tempo, avistarei debaixo do denso lixo cultural,

aquilo que seria a minha inata realidade existencial.

Garanta convicta a mim mesma

levar a cabo a tarefa de conhecer-me.

Os tipos que tenho feito até aqui, admito,

refletem muito precariamente o que sou.

Imagino de quanto sofrimento pouparei a mim e a ele

ao conseguir apresentar-me nua ao mundo !..

Como diferirá esta nudez da exibida pelas capas de revistas !...

A minha nudez abalará as certezas de um mundo

miseravelmente necessitado de autenticidade.

Poucos serão nesta hora solene

os que, corajosos, me fitarão,

sensibilizados com o meu renascimento.

Deixarei de significar o grande trunfo do “marketing” .

Estarei realizadamente fora de moda, desprestigiada.

O paraíso talvez não seja dos resignados, dos passivos...

Levei muito tempo para entender e aceitar isso.

Inculpar-me por negar valores escravizantes

verão, os arquitetos beneficiários da minha adulteração,

está ausente de todas as minha cogitações.

Investirei nesta atitude sem revanchismos ou competições.

Reivindicarei com energia, em contrapartida

a inalienável gerência e produção de todo o meu viver.